domingo, 27 de fevereiro de 2011

AMIGOS

Escolho os meus amigos não pela pele ou outro arquetipo qualquer, mas pela pupila. Têm que ter brilho questionador e tonalidade inquietante. A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero o meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e aguentem o que há de pior em mim. Quero-os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças. Escolho os meus amigos pela cara lavada e pela alma exposta. Não quero só o ombro ou o colo, quero também a sua maior alegria. Amigo que não ri junto não sabe sofrer junto. Os meus amigos são todos assim: metade "tolice", metade seriedade. Não quero risos previsíveis nem choros piedosos. Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade a sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice. Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois vendo-os loucos e santos, tolos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que normalidade é uma ilusão imbecil e estéril.
Oscar Wilde

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Afonso Cruz

António Carlos Cortez

RESPOSTA A DRUMMOND




É sempre no meu sempre aquele nunca

é sempre nesse nunca aquele agora

é sempre nesse agora aquele nada



No mesmo nada encontro sempre tudo

mesmo se o mundo é nada sempre assim

mesmo se assim tudo me desperta



e eu me desperto a adormecer no fim

de cada dia de trabalho errado

em cada hora de um amor mal feito



e digo mesmo se este mundo vale

a expectativa de querer ser sempre

aquela esp’rança onde o bem e o mal



se aliam sempre para quem conserva

o sonho ou a fúria de não estar sonhando

Mas novamente dói a dor no peito



e dói no corpo o que nos vai passando

mágoas ou risos ou o grito dado

e logo atirado para um vale escuro



onde não oiçamos a revolta infinda

de vivermos os dias nesta escura selva

a que nem Dante chamou talvez de vida



a que chamamos coisa e porém amamos

Sempre este querer de violência tanta

e esta crença de que o canto estale



e o dia venha porque nós lutamos

para além das forças que supomos nossas

para além dos sonhos que já não esperamos



para além do verso e do corpo gasto

Sempre este homem que se vai cansando

sempre estes ossos em que equilibramos



esta carne frágil este dia vasto

esta vida feita no que é morte nela

este amor sujeito ao que é sempre efémero



este ódio ao mundo que é amor eterno



[in Depois de Dezembro, Licorne, 2010]

Conta-me uma história...

ANNA BURIGHEL

A lua








                              ilustrações de Anna Burighel

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Maritxsell Ribas



A GRAMÁTICA DO AMOR

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Oreli

CREIO

Creio nos anjos

que andam pelo mundo

Creio na deusa

com olhos de diamante

Creio em amores lunares

com piano ao fundo,

Creio nas lendas,

nas fadas, nos atlantes,



Creio num engenho

que falta mais fecundo

De harmonizar

as partes dissonantes,

Creio que tudo é eterno

num segundo,

Creio num céu futuro

que houve dantes,



Creio nos deuses

de um astral mais puro,

Na flor humilde

que se encosta no muro

Creio na carne

que enfeitiça o além



Creio no incrível,

nas coisas assombrosas,

Na ocupação do mundo

pelas rosas,

Creio que o amor  tem asas

de ouro.

Amén


Natália Correia

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

A Marte

A Marte
João Só e Abandonados

Acordei de manhã
Ainda meio baralhado
De teres sido tu a estrela
Daquele filme alugado

Deixámos o Bruce Lee
Entregue às artes marciais
Quando olhaste para mim
Sem efeitos especiais

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

Fui ter contigo ao café
Não me cansei de olhar para ti
Disseste mata-me a sede
Tira-me daqui

E o mercúrio subiu
E eu não sou de pedra
P’ra uma Vénus como tu
Não há água nesta terra!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

Estou em terra
Se não me engano
Fizeste de mim
Um verdadeiro marciano

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

A Marte, vou a Marte
Se é o que tu queres
Eu vou a Marte!

João Só e Abandonados - A Marte

Florence + The Machine - Dog Days Are Over (2010 Version)

The Script - Break Even Official music video

Falta

"E eu quero brincar às escondidas contigo e dar-te as minhas roupas e dizer que gosto dos teus sapatos e sentar-me nos degraus enquanto tu tomas banho e massajar o teu pescoço e beijar-te os pés e segurar na tua mão e ir comer uma refeição e não me importar se tu comes a minha comida e encontrar-me contigo no Rudy e falar sobre o dia e passar à máquina as tuas cartas e carregar as tuas caixas e rir da tua paranóia e dar-te cassetes que tu não ouves e ver filmes óptimos, ver filmes horríveis e queixar-me da rádio e tirar-te fotografias a dormir e levantar-me para te ir buscar café e brioches e folhados e ir ao Florent beber café à meia-noite e tu a roubares-me os cigarros e a nunca conseguir achar sequer um fósforo e falar-te sobre o programa de televisão que vi na noite anterior e levar-te ao oftalmologista e não rir das tuas piadas e querer-te de manhã mas deixar-te dormir um bocado e beijar-te as costas e tocar na tua pele e dizer quanto gosto do teu cabelo dos teus olhos dos teus lábios do teu pescoço dos teus peitos do teu rabo do teu…
E sentar-me nos degraus a fumar até o teu vizinho chegar a casa e se sentar nos degraus a fumar até chegares a casa e preocupar-me quando estás atrasada e ficar surpreendido quando chegas cedo e dar-te girassóis e ir à tua festa e dançar até ficar todo negro e pedir desculpa quando estou errado e ficar feliz quando me desculpas e olhar para as tuas fotografias e desejar ter-te conhecido desde sempre e ouvir a tua voz no meu ouvido e sentir a tua pele na minha pele e ficar assustado quando estás zangada e um dos teus olhos vermelho e o outro azul e o teu cabelo para a esquerda e o teu rosto para oriente e dizer-te que és lindíssima e abraçar-te quando estás ansiosa e amparar-te quando estás magoada e querer-te quando te cheiro e ofender-te quando te toco e choramingar quando estou ao pé de ti e choramingar quando não estou e babar-me para o teu peito e cobrir-te à noite e ficar frio quando me tiras o cobertor e quente quando não o fazes e derreter-me quando sorris e desintegrar-me quando te ris e não compreender por que é que pensas que eu te estou a deixar quando eu não te estou a deixar e pensar como é que tu podes achar que eu alguma vez te podia deixar e pensar em quem tu és mas aceitar-te na mesma e contar-te sobre o rapaz da floresta encantada de árvores anjo que voou por cima do oceano porque te amava e escrever-te poemas e pensar por que é que tu não acreditas em mim e ter um sentimento tão profundo que para ele não existem palavras e querer comprar-te um gatinho do qual teria ciúmes porque teria mais atenção que eu e atrasar-te na cama quando tens de ir e chorar como um bebé quando finalmente vais e ver-me livre das baratas e comprar-te prendas que tu não queres e levá-las de volta outra vez e pedir-te em casamento e tu dizeres não outra vez mas eu continuar a pedir-te porque embora tu penses que eu não estou a falar a sério eu estou mesmo a falar a sério desde a primeira vez que te pedi e vaguear pela cidade pensando que ela está vazia sem ti e querer aquilo que queres e achar que me estou a perder mas saber que estou seguro contigo e contar-te o pior que há em mim e tentar dar-te o meu melhor porque não mereces menos e responder às tuas perguntas quando deveria não o fazer e dizer-te a verdade quando na verdade não o quero e tentar ser honesto porque sei que preferes assim e pensar que acabou tudo mas ficar agarrado a apenas mais dez minutos antes de me atirares para fora da tua vida e esquecer-me de quem sou e tentar chegar mais perto de ti porque é maravilhoso aprender a conhecer-te e vale bem o esforço e falar mau alemão contigo e pior ainda em hebreu e fazer amor contigo às três da manhã e de alguma maneira de alguma maneira de alguma maneira transmitir algum do esmagador, imortal, irresistível, incondicional, abrangente, preenchedor, desafiante, contínuo e infindável amor que tenho por ti..."

Sarah Kane

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Papá

Um rio de ternura...

Argine-HD from jujube on Vimeo.

Doce Canção

Como hei-de segurar a minha alma
para que não toque na tua? Como hei-de
elevá-la acima de ti, até outras coisas?
Ah, como gostaria de levá-la
até um sítio perdido na escuridão
até um lugar estranho e silencioso
que não se agita, quando o teu coração treme.
Pois o que nos toca, a ti e a mim,
isso nos une, como um arco de violino
que de duas cordas solta uma só nota.
A que instrumento estamos atados?
E que violinista nos tem em suas mãos?
Oh, doce canção.

Rainer Maria Rilke

Todos os dias faz anos
que foram inventadas as palavras.
É preciso festejar todos os dias
o centenário das palavras.

Almada Negreiros